Estas minhas férias, apenas dez dias, não tem muito que contar.
Estive em Manga do Mar Menor, voltei lá e que desilusão, cada ano que passa vamos encontrando os “paraísos terrestres” com mais cimento.
Não faço comentários, deixo-vos com as fotografias.
Depois, para matar saudades fui a S. Martinho do Porto, ver os arranjos… baaahh, não está mal, nem bem. Está diferente e esqueceram-se dos parques de estacionamento e do espírito da terra.
Como em tudo, hoje, o espírito também vai no entulho.
Bem que podiam ter entregue o projecto a um arquitecto… talvez ficasse melhor.
Não sei quem foi o “artista” responsável pelo projecto. Provavelmente um “artista”, que nunca teria deixado de ser desenhador no gabinete de algum arquitecto, se não tivesse um amigalhaço autarca, tão pacóvio quanto ele e que lhe deu a oportunidade de “autocadar” o projecto.
Sim porque desenhar eles já não sabem…
Sul de Espanha - La Manga
La Manga - por cima do casario, ao fundo, o farol do Cabo de Palos
La Manga - Praia dos Pinheiros (Mar Menor)
Salvou-se este bocadinho
Praia dos Pinheiros (Mar Menor)Que desperdício. Então aqui este espaço não dava perfeitamente para construir um prédio de quinze ou vinte andares?... Só pinheiros e mais pinheiros que nem há lugar para por os pés.
(aih, se eu fosse o "alcaide do ajuntamento")
* * * * *
Quando eu era criança e mais tarde já um jovem com 18 anos, tive o privilégio de conhecer lugares como a Costa de Caparica, São Martinho do Porto, o Luso e mais tarde, homem casado ou em vias disso, conheci São Pedro de Moel, Vidago e Pedras Salgadas.
Em todos estes lugares, se encontrava patente, não se via, mas sentia-se um ambiente especial, tradicional, que se foi criando através dos tempos e passado como testemunho de geração em geração e que na falta de melhor termo, eu resolvi chamar de, Espírito da Terra.
Dele faziam parte, não apenas o aroma do mar, das flores, dos campos, mas também a harmonia das construções na sua arquitectura cuidada e equilibrada nas proporções.
Do espírito da terra, faziam igualmente parte, as pessoas. Não apenas aquelas pessoas elegantes que frequentavam esses lugares durante a “Seson“, como era habito dizerem quando se referiam á época de veraneio.
Faziam parte desse espírito também, as pessoas da terra, a quem por costume já conhecíamos e tínhamos por amigos.
Não apenas os mais humildes, como o senhor Luís e a senhora Júlia, moleiros da azenha, a quem os meus pais visitavam regularmente, não só para se deliciarem com a água fresca da nascente, como para me mostrar como era moída a farinha do pão que eu comia na cidade.
De igual modo, também cumprimentávamos a senhora do correio, onde íamos levantar ou depositar as nossas cartas, por vezes até telefonar. Sim, naquele tempo não tínhamos tele-móveis.
Faziam parte deste ambiente, o senhor Adelino, porteiro do hotel, a Graça dos bolos e tantos outros. O Quim Barbeiro, o Chico Zé, este último um pobre diabo que sabendo ler e escrever, publicava numa lousa as noticias da aldeia, que pendurava na porta da barbearia do Quim. Dela constavam, as mortes, os aniversários os nascimentos e até os casamentos. (Agora o Besnico está mesmo comovido)
De igual modo, se cumprimentava o senhor Conselheiro, o senhor Doutor, formado em Coimbra e que era o médico das termas.
Quantas e quantas tardes de conversa com o senhor doutor… tinha sempre histórias engraçadas para contar, fruto de muitos anos como médico de aldeia, num tempo em que o médico não ganhava o suficiente, para pagar as contas da farmácia, dos medicamentos que gratuitamente fornecia aos seus doentes mais necessitados. Valiam-lhe as consultas na Casa do Povo e no verão, as que dava aos veraneantes mais abastados que vinham da cidade, para fazerem as suas curas termais.
Chamávamos-lhe o “João Semana” por analogia com a figura do médico, criada por Júlio Dinis no seu conto “As Pupilas do Senhor Reitor”.
Parece que o estou a ver; alto, magro, olhos azuis, cabelo branco e com aquele porte de cavalheiro e uma maneira especial de conversar e reflectir sobre os assuntos, característica dos velhos doutores de Coimbra.
Quantas e quantas vezes em pleno Inverno, noite alta, contava-nos, era chamado a assistir a um parto.
Nunca se recusou, tenho testemunhos disso. Metia-se no seu automóvel e quando a estrada acabava, lá estava alguém, com uma candeia, um burro ou uma mula, para acompanhar o Senhor Doutor, serra acima, por onde os caminhos cobertos de neve, já não vão. Por perto, ouviam-se os latidos dos lobos. Assim, tantas vezes ao longo da vida, lá chegava a um casebre, onde á luz de uma vela, trazia para a luz da vida uma criança ou fechava para sempre os olhos de um moribundo.
- Quanto devo Sr. Doutor?...
- Ora deixe lá isso… o que é preciso é que o rapaz vá ás sortes.
E dizendo isto, lá se ia embora, serra a baixo, não sem antes, discretamente sobre a mesa, escondida por baixo da receita, deixar uma nota de vinte escudos.
(quando não é possível repartir a riqueza, que se saiba ao menos, repartir as dificuldades)
Nesses lugares por onde andei, respirava-se um ambiente de família. Deixem que vos conte.
Não irei identificar pessoas nem apontar concretamente nenhum sítio em especial. Mas o que vos vou contar, teve por cenário todos os lugares que acima já referenciei.
Como o “conto” é longo, hoje deixo-vos apenas com este bocadinho.
Se gostarem, voltarei amanhã com “O ESPIRITO DA TERRA II